Gente fina, elegante e sincera
Martha Medeiros
Entrei numa loja de discos - estava às moscas, só mesmo eu para ainda comprar CDs - e tocava uma música do Lulu Santos. Aliás, a que mais gosto dele, Tempos Modernos, principalmente daquela parte que diz: "Eu vejo um novo começo de era/de gente fina, elegante e sincera/com habilidade/pra dizer mais sim do que não...”
Faz um tempão que eu espero essa nova era começar, mas por enquanto ainda vejo por aí gente grossa e deselegante, que não dá a menor importância para a maneira como trata os outros.
Lembrei dessa música porque semana passada publiquei no meu blog um texto de não mais de 10 linhas falando sobre minha satisfação com a conquista do Inter no Campeonato Gaúcho e me declarando uma colorada sincera, porém meia-boca, já que foi-se o tempo em que eu ia ao estádio e sabia a escalação de cor. Hoje acompanho o time de longe, mas ainda me emociono com as grandes conquistas.
Audácia minha, declarar que sou colorada em público. Há quem considere isso um insulto, e xinga pra valer. Não importa que seja uma minoria: enquanto existir um único destemperado que parta pra ignorância por causa de algo tão saudável como o esporte, o risco de violência nos estádios seguirá existindo. A rivalidade sempre fez parte do jogo e uma segunda-feira sem flauta não é segunda-feira. Mas há quem leve essa rivalidade a sério demais, e imagino que sejam essas as pessoas que vão aos estádios em busca de discussão e pancadaria.
Tem muita gente que ainda se sente ofendida pelas diferenças dos outros - qualquer diferença. Incapazes de levar a vida com leveza, eles espancam homossexuais, mendigos e prostitutas, discriminam os que têm tatuagens, revoltam-se com os que votam em partidos que não o deles, perseguem os que possuem outra religião e, claro, brigam feio com torcedores de outros times. Essa é a maior bandeira que o inseguro pode dar: se há pessoas que não são como ele, talvez sejam melhores do que ele, então só lhe resta atacá-las, agredi-las, destruí-las. Conviver em paz, nem pensar.
Sigo aguardando um novo começo de era, com gente fina (que não é sinônimo de riqueza), gente elegante (que não é sinônimo de grife) e gente sincera (que não é sinônimo de brutalidade), com habilidade para cuidar do planeta não apenas no que diz respeito à ecologia, mas também em relação ao superaquecimento dos ânimos. Gente mais cool - não necessariamente gelada - torna o ar mais respirável.
ZERO HORA, 14 de maio de 2008 N° 15601
Quadro de Trish Biddle - Reflections IV
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