Quando vejo retratos, quando sinto cheiros,
quando escuto uma voz, quando me lembro do passado,
eu sinto saudades...
Sinto saudades de amigos que nunca mais vi,
de pessoas com quem não mais falei ou cruzei...
Sinto saudadesda minha adolescência,
do meu colégio querido
do meu primeiro amor, do meu segundo,
do terceiro, do penúltimo
e daqueles que ainda vou ter, se Deus quiser...
Sinto saudades do presente, que não aproveitei de todo,
lembrando do passado e apostando no futuro...
Sinto saudades do futuro, que se idealizado,
provavelmente não será do jeito que eu penso que vai ser...
Sinto saudades de quem me deixou e de quem eu deixei,
de quem disse que viria e nem apareceu;
de quem apareceu correndo, sem me conhecer direito,
de quem nunca vou ter a oportunidade de conhecer.
Sinto saudades dos que se foram
e de quem não me despedi direito;
daqueles que não tiveram como me dizer adeus;
de gente que passou na calçada contrária da minha vida
e que só enxerguei de vislumbre;
de coisas que tive e de outras que não tive mas quis muito ter;
de coisas que nem sei que existiram.
Sinto saudades de coisas sérias, de coisas hilariantes,
de casos, de experiências...
Sinto saudades do cachorrinho que eu NÃO tive
um dia e que me amaRIa fielmente, como só os
cães são capazes de fazer,
dos livros que li e que me fizeram viajar, dos discos
que ouvi e que me fizeram sonhar,
das coisas que vivi e das que deixei passar,
sem curtir na totalidade.
Quantas vezes tenho vontade de encontrar
não sei o que, não sei onde, para resgatar alguma coisa
que nem sei o que é e nem onde perdi...
Vejo o mundo girando e penso que poderia estar
sentindo saudades em japonês, em russo, em italiano,
em inglês, mas que minha saudade, por eu ter nascido
no Brasil, só fala português, embora, lá no fundo,
possa ser poliglota.
Aliás, dizem que costuma-se
usar sempre a língua pátria, espontaneamente,
quando estamos desesperados, para contar dinheiro,
fazer amor e declarar sentimentos fortes, seja lá
em que lugar do mundo estejamos.
Eu acredito que um
simples "I miss you", ou seja lá como possamos
traduzir saudade em outra língua, nunca terá a
mesma força e significado da nossa palavrinha.
Talvez não exprima, corretamente, a imensa falta
que sentimos de coisas ou pessoas queridas.
E é por isso que eu tenho mais saudades...
Porque encontrei uma palavra
para usar todas as vezes em que sinto este
aperto no peito, meio nostálgico,
meio gostoso, mas que funciona melhor do que
um sinal vital quando se quer falar de vida
e de sentimentos.
Ela é a prova inequívoca de
que somos sensíveis, de que amamos muito o
que tivemos e lamentamos as coisas boas
que perdemos ao longo da nossa existência...
Sentir saudade,
é sinal de que se está vivo!
Clarice Lispector
Clarice Lispector
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