Rosana Braga
Aposto que você completou a frase, ainda que mentalmente: "... ouve o que não quer!". Afinal, é para isso que servem os ditos populares – para nos fazer crer neles como verdades absolutas. Mas será?!?
Em alguns casos, certamente vamos ouvir o que não queremos ao falarmos o que queremos, mas em outros, certamente poderemos ouvir o que queremos. Portanto, a frase mais certa seria: "Quem fala o que quer, ouve o que o outro quer" e ponto. Simples assim, óbvia e justa assim!
O problema é que, por não suportarmos a idéia de que o outro pode nos falar o que não queremos ouvir, preferimos nem dizer o que queremos. Ou ainda, para não darmos o direito ao outro de fazer o que ele quiser, muitas vezes deixamos de fazer o que temos vontade.
Quem nunca ouviu alguém dizer algo do tipo "Eu não saio com meus amigos porque senão ele vai se achar no direito de sair também!". Ou algo assim "Mas e se eu disser que quero passar o final de semana com ela e ela me disser que prefere viajar com os pais dela?". E por aí vai...
O mundo da imaginação rola solto e ninguém se expõe, ninguém se atreve a ser autêntico, a bancar seus desejos e "pagar pra ver" quais são os desejos do outro.
Um amigo meu brigou com a esposa (e quem já dividiu a cama com alguém, sabe: quando um casal briga, o espaço entre um e outro se torna tão grande que na cama onde os dois dormem passa a caber mais umas três pessoas...) e daí ele me disse: "Poxa, eu fiquei com uma vontade danada de abraçá-la durante a noite!".
E eu: "Ué, e por que não abraçou?". Ao que ele rapidamente se defendeu: "Ah, não! E se ela não quisesse? Ou se ela ficasse achando que, só por isso, estou aceitando que estou errado?".
Mas eu insisti: "Mas se ela não quisesse, caberia a ela que se manifestasse e demonstrasse o que queria. Além do mais, se ela vai achar isso ou aquilo por conta da sua vontade, é problema dela e não seu! Os desejos dela são dela e os seus, são seus. Enquanto vocês ficam imaginando o que o outro pode pensar ou fazer, ninguém revela o que realmente está sentindo ou desejando. Por que você simplesmente não faz a sua parte e deixa que ela faça a dela pra ver o que acontece?".
Ele ficou me olhando, pensativo, com uma expressão um tanto confusa, como quem – de repente – se vê diante de uma nova possibilidade; mas logo depois voltou a se defender: "Ah, não! Prefiro ficar na minha a levar um fora!". E eu, pretensiosamente, traduzi: "Quer dizer, então, que você prefere não fazer o que está com vontade só para não correr o risco de descobrir que a vontade dela não é igual a sua? E mais: prefere se dar por vencido a arriscar ter seu abraço retribuído?".
Ele riu, um tanto perturbado com minhas indagações, e nada mais falou. Ficamos em silêncio, cada qual com suas reflexões... mas estou certa de que, da próxima vez, ele vai pensar melhor se realmente deve abdicar de seus desejos por medo do desejo do outro.
Sinceramente, eu sei que não é nada fácil ser rejeitado ou perceber que o que a gente quer não vai ser possível porque o outro não quer, mas também me sinto cada dia mais inteira e satisfeita comigo mesma na medida em que consigo assimilar que sou responsável tanto por aquilo que faço quanto por aquilo que deixo de fazer, especialmente quando o assunto passa pelo meu coração...
E assim, mesmo sentindo medo, tenho preferido arriscar, fazer a minha parte e deixar que o outro faça o que quiser fazer, pense o que quiser pensar e sinta o que puder sentir.
Porque só deste modo estarei vivendo as relações com todo o meu ser, amando como eu realmente quero amar, sem que minhas fantasias sobre o que ele pensa, sente e quer conduzam os meus desejos.
O resultado? Tem sido bem mais positivo do que eu poderia supor, felizmente!
Rosana Braga é Escritora, Jornalista e Consultora em Relacionamentos Palestrante e Autora dos livros "Alma Gêmea - Segredos de um Encontro" e "Amor - sem regras para viver", entre outros.
http://www.rosanabraga.com.br/ e Comunidade no Orkut
Email: rosanabraga@rosanabraga.com.br
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