Não é um defeito que mereça entrar no rol dos crimes hediondos, mas é bem chato: pessoas que falam em cima da fala da gente. Ainda nem terminamos a frase, e o nosso interlocutor já está falando junto, numa demonstração clara de que não importa o que estamos dizendo, ele próprio tem algo mais importante a dizer.
Pode parecer uma crítica, mas é, na verdade, uma autocrítica: entre essas pessoas, estou eu mesma. Minha família é ótima, alegre, desinibida, mas tem essa mania incontrolável: todos falam em cima dos outros. Não somos italianos, e sim ansiosos (nascidos e criados num país fictício chamado Ânsia). É um costume que passa de geração para geração. Mães, pais, avós, tios, primas, todos praticam essa esquizofrenia de não permitir que ninguém termine uma fala, ninguém. A conversa é de doidos, mas as festas são animadas.
Fui incorrigível, desse mesmo jeito, por muito tempo, até que comecei a perceber o quanto a situação é desagradável para quem não faz parte da nossa árvore genealógica. Levei uns puxões de orelha das amigas, o que me salvou. Hoje, se não estou 100% curada, posso dizer que já consigo me conter um pouco. Procuro não sair falando junto, em cima, atrapalhando o trânsito das palavras. Ouço o que o outro tem a dizer, mas ainda cometo o pecado de terminar a frase por ele. Basta que o coitado vacile na conclusão da sua argumentação, buscando uma palavra que não vem, e eu rapidamente encontro a palavra que ele procurava. Quase sempre acerto, o que não me redime. Por que raios não esperei ele próprio encerrar seu discurso? Nascida em Ânsia, num lugarejo chamado Impaciência.
Pode parecer uma crítica, mas é, na verdade, uma autocrítica: entre essas pessoas, estou eu mesma. Minha família é ótima, alegre, desinibida, mas tem essa mania incontrolável: todos falam em cima dos outros. Não somos italianos, e sim ansiosos (nascidos e criados num país fictício chamado Ânsia). É um costume que passa de geração para geração. Mães, pais, avós, tios, primas, todos praticam essa esquizofrenia de não permitir que ninguém termine uma fala, ninguém. A conversa é de doidos, mas as festas são animadas.
Fui incorrigível, desse mesmo jeito, por muito tempo, até que comecei a perceber o quanto a situação é desagradável para quem não faz parte da nossa árvore genealógica. Levei uns puxões de orelha das amigas, o que me salvou. Hoje, se não estou 100% curada, posso dizer que já consigo me conter um pouco. Procuro não sair falando junto, em cima, atrapalhando o trânsito das palavras. Ouço o que o outro tem a dizer, mas ainda cometo o pecado de terminar a frase por ele. Basta que o coitado vacile na conclusão da sua argumentação, buscando uma palavra que não vem, e eu rapidamente encontro a palavra que ele procurava. Quase sempre acerto, o que não me redime. Por que raios não esperei ele próprio encerrar seu discurso? Nascida em Ânsia, num lugarejo chamado Impaciência.
Nós, os acelerados de berço, não fazemos por mal, mas precisamos nos dar conta de que duas pessoas falando juntas é a anticomunicação. Sabemos como é azucrinante ter que concluir nosso pensamento e, ao mesmo, tempo ouvir o que o nosso interlocutor está dizendo. Por isso, me compadeço de entrevistadores que usam o ponto eletrônico no ouvido, aquele dispositivo que permite que se receba instruções do diretor do programa. Que sufoco ouvir duas vozes ao mesmo tempo, a do entrevistado falando sobre sua obra e a do diretor avisando: “Arruma o cabelo que caiu no rosto”, “Não esquece de perguntar sobre o escândalo do ano passado”, “Corta esse chato e chama o comercial”.
Duas vozes simultâneas: adeus, diálogo. Faz alguns anos que prometi a mim mesma: não vou mais me atravessar. Vou aguardar minha vez. Esperar a amiga falar, o namorado concluir. Vou escutar. Vou respeitar. Quieta, deixa ele acabar. Ai, que aflição, não vou conseguir. Putz, não me segurei. Falei em cima, de novo.
Desculpe, desculpe. Termine o que você estava dizendo.
Martha Medeiros
marthamedeiros@terra.com.br
Publicado no Jornal de Santa Catarina n° 12443 em 17/12/2011.
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