Outro tipo de mulher nua Martha Medeiros
Nunca vi tanta mulher nua. Os sites da internet renovam semanalmente seu estoque de gatas vertiginosas. O que não falta é candidata para tirar a roupa. Serviu cafezinho numa cena de novela? Posa pelada. É prima de um jogador de basquete? Posa pelada. Caiu do terceiro andar? Posa pelada.
Depois da invenção do photoshop, até a mais insignificante das criaturas vira uma deusa, bastando pra isso uns retoquezinhos aqui e ali. Dá uma grana boa. E o namorado apóia, o pai fica orgulhoso, a mãe acha um acontecimento, as amigas invejam, então pudor pra quê?
Não sei se os homens estão radiantes com esta multiplicação de peitos e bundas. Infelizes não devem estar, mas duvido que algo que se tornou tão banal ainda enfeitice os que têm mais de 14 anos. Talvez a verdadeira excitação esteja, hoje, em ver uma mulher se despir de verdade – emocionalmente.
Nudez pode ter um significado diferente e muito mais intenso. É assistir a uma mulher desabotoar suas fantasias, suas dores, sua história. É erótico ver uma mulher que sorri, que chora, que vacila, que fica linda sendo sincera, que fica uma delícia sendo divertida, que deixa qualquer um maluco sendo inteligente. Uma mulher que diz o que pensa, o que sente e o que pretende, sem meias-verdades, sem esconder seus pequenos defeitos – aliás, deveríamos nos orgulhar de nossas falhas, é o que nos torna humanas, e não bonecas de porcelana. Arrebatador é assistir ao desnudamento de uma mulher em quem sempre se poderá confiar, mesmo que vire ex, mesmo que saiba demais.
Pouco tempo atrás, posar nua ainda era uma excentricidade das artistas, lembro que esperava-se com ansiedade a revista que traria um ensaio de Dina Sfat, por exemplo – pra citar uma mulher que sempre teve mais o que mostrar além do próprio corpo. Mas agora não há mais charme nem suspense, estamos na era das mulheres coisificadas, que posam nuas porque consideram um degrau na carreira. Até é. Na maioria das vezes, rumo à decadência. Escadas servem para descer também.
Não é fácil tirar a roupa e ficar pendurada numa banca de jornal mas, difícil por difícil, também é complicado abrir mão de pudores verbais, expor nossos segredos e insanidades, revelar nosso interior. Mas é o que devemos continuar fazendo. Despir nossa alma e mostrar pra valer quem somos, o que trazemos por dentro. Não conheço strip-tease mais sedutor.
Publicado no Jornal Zero Hora em 07 de agosto de 2005.
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