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Amor de pai e filha - Nunca Mais

Amor de pai e filha - Nunca Mais
Existe uma frase muito sábia "O que podes fazer hoje não deixe para amanhã".
Trata-se de um dito popular que tenho às vezes usado para pessoas que têm me procurado para terapias e se vêem diante de situações de desenganos, desacertos e de condutas pouco éticas por parte de parentes ou amigos.

Sempre costumo afirmar: deixem o orgulho de lado e vão à procura de um diálogo.

A benevolência, a humildade e a compreensão dos fatos sempre resulta em um final positivo para nossa consciência.

Chamo isto de limpar a mesa antes de colocar uma toalha limpa.

Falo por experiência própria pois grande parte da minha vida sofreu a influência de uma ação por parte do meu pai, aos meus 19 anos, e cujo resultado provocou um afastamento entre ambos.

Eu não queria dar o braço a torcer diante dos fatos e ele, por sua vez, em princípio agiu da mesma forma.

O tempo passou e o nosso relacionamento, embora amenizado, não passava de uma mera formalidade.

Simplesmente, não conseguíamos verbalizar nossos sentimentos.

Sempre que precisei dele em momentos de dificuldade da minha vida, mesmo sem pedir, ele sempre se fazia presente, mas depois por sua vez retornava à sua concha.

E assim passou-se ano após ano; encontrávamos às vezes aos fins de semana, na praia ou em festas familiares.

Eu, por minha vez, sabendo do seu imenso amor pelos netos, sempre que possível deixava ambos com os meus pais.

Se para mim ele havia se fechado em seus sentimentos, para os netos ele foi o companheiro ideal, o que demonstrava e falava abertamente para seus amigos.

Após muitas lutas e desacertos na minha vida, encontramo-nos por acaso no mesmo vôo, indo para São Paulo.

Ele seguiria para a Alemanha para uma exposição internacional e eu por minha vez estava indo para Salvador.

Foi naquele curto espaço de tempo, que ambos ensaiamos uma trégua, prometendo um ao outro que após a nossa volta iríamos nos encontrar e conversar novamente como pai e filha, deixando de lado as nossas desavenças.

Entretanto, o destino traçou um outro caminho para esse reencontro.

Ainda conversando com ele por telefone após sua volta, ficou combinado que naquele mesmo sábado eu iria até a sua residência na Vila.

Logo após o almoço, segui viagem até a sua casa, levando comigo o meu filho. A menina por sua vez já se encontrava com eles.

Na medida em que subia pela estrada particular até a sua residência, vi um tumulto em frente a porta de entrada.

Meu coração acelerou a mil, pois sabia imediatamente que algo havia acontecido.

Pensei na minha mãe, que já se encontrava doente, na minha filha que estava com eles, mas jamais imaginei que justamente ele, que sempre dizia ter uma saúde de ferro estaria deitado em cima do tapete, no chão da sala, morto.

O nosso entendimento de pai para filha aconteceu: comigo sentada no chão, tendo no meu colo a sua cabeça inerte.

Não vi o tempo passar, até que alguém colocou a mão no meu ombro dizendo que teriam que preparar o corpo para o velório. Ele parou para mim naquele instante e as imagens de toda uma vida que passamos juntos foram passando pela minha frente como um filme.

Foi quando tomei consciência que nunca mais poderia debruçar-me ao seu lado como o fazia quando criança enquanto ele desenhava, que nunca mais poderia acompanhá-lo quando ia decorar uma vitrine, que nunca mais passearia com ele pelos bosques e campos floridos e que nunca mais teria a oportunidade de fazer ou falar tantas coisas que não foram feitas e não foram ditas, abraços que não foram dados, carinhos que não foram trocados.

Mas como tudo passa nessa vida, os momentos felizes e também os infelizes, os problemas que vieram na seqüência me empurraram para frente sem tréguas e a vida continuou o seu rumo.

Por isso sempre aconselho: nunca deixe para amanhã o que podes resolver hoje.

Não deixe de enviar uma carta amiga, perdoar sem restrições, abraçar aqueles que amas e por eles és amado, de sorrir para alguém entristecido, de conversar com alguém solitário necessitado de um gesto fraterno, de apreciar as flores nos jardins, de alegrar-se com o canto dos pássaros ou com o barulho da chuva, de agradecer pelo sol que ilumina a terra, pela água benfazeja, apreciar um luar e agradecer principalmente por todas as oportunidades, pois cada momento da vida é único e merece ser vivido com plenitude, pois a tua paz depende somente de ti.

Quando chamada pela empresa em que trabalhava para retirar os seus pertences no que havia sido a sua escrivaninha, em cada folha de papel onde algo estava escrito, me deparei com um pai que eu não havia conhecido.

Tempos após, através de uma psicografia recebida de um centro espírita me pedia que não procurasse na arte da pintura a minha realização, como ele o havia feito; mas sim através da literatura.

Eis me aqui neste momento pai, realizando o que outrora me pediste.

Elke Tschersovsky
elke.t@terra.com.br

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