Postagens

Torne-se um madrugador...

Torne-se um madrugador...

A loucura da cidade, a correria do trabalho, os dias quentes e longos, stress, o cansaço...

O barulho do dia, a agitação do começo de uma noite...
Torne-se um madrugador da semana...
A madrugada trás o silêncio. Em seu véu negro permite que pensamentos circulem livremente e encontrem respostas para seus questionamentos.
A madrugada quente, que nos permite ter pensamentos mais densos, onde analisamos nossos problemas e encontramos as soluções que pareciam tão difíceis.
A madrugada fria, que nos proporciona o relaxamento completo, o desligamento de pesos.
Aquela em que sorrimos ao lembrar de grandes e pequenas coisas.
Abra a janela do quarto, olhe o céu, fixe-se no movimento das folhas, no ir e vir de carros, no canto das corujas e grilos. Escute a voz da escuridão. Ela não é tão assustadora. Por viver na noite, tem muita experiência sobre os perigos da vida.
Torne-se um madrugador de fim de semana...
Pegue o carro e dirija sem um destino certo. Divida sua atenção entre o volante, e as pessoas que caminham. Brinque de imaginar o pensamento das outras pessoas. Coloque-se no lugar de quem está caminhando sozinho.
Pare em algum lugar bem movimentado. Peça um drinque e observe. Penetre em cada olhar, em cada rosto. Decifre cada sorriso, cada cara amarrada. Escute com o coração as conversas que conseguir ouvir. Analise os casais, analise os solteiros. Aprenda em silêncio a mágica de estar sempre rodeado de bons e maus exemplos.
Torne-se um madrugador...
Entenda que a madrugada carrega em seus ombros todos os acontecimentos do dia de todas as pessoas, e veja como seus problemas são pequenos.
Ouça o barulho da madrugada. Silêncio... Aprenda que é mais sábio quem ouve mais e fala menos.
Pense que na madrugada existem pessoas em hospitais, velórios, acidentes... E se veja dentro da tranqüilidade de seu lar. Sorria por ainda ter a oportunidade de ver à madrugada.
Compreenda que a madrugada é solitária, e precisa de alguém pra conversar. Sem ouvir nada, perceba que o silêncio de um olhar fala muito mais do que mil palavras.
Relembre as madrugadas que passou em claro, mas que não foram utilizadas para aprender. Recorde os travesseiros molhados, os olhos inchados, o aperto no peito... Sorria por ter passado essa fase. Tudo passa.
Torne-se um madrugador...
Use o dia para realizar, à noite para conversar e a madrugada para refletir. Se todos tirassem uma hora que seja da madrugada para fazer um balanço à gente viveria menos angustiado.
Torne-se um madrugador...
Acenda um cigarro, tome um cálice de vinho ou ouça uma música que goste. A madrugada mesmo parecendo triste quer fazer as pessoas felizes.
Torne-se um madrugador, e perceba que o céu é mais bonito à noite. Trabalhe seus pensamentos na madrugada para que aos poucos você se torne uma pessoa mais bonita.
Torne-se um madrugador...
Durma com a sensação de alívio, como ter tirado uma dúvida em sala de aula...
Torne-se um madrugador, para que o dia amanheça mais colorido.

2008/03/19 enviada por Rafaela Paes de Campos, publicada no site: http://www.dejovu.com/mensagens/ver/?28309/Torne-se+um+madrugador...

Trabalhar e sofrer

Trabalhar e sofrer
Lya Luft

"O trabalho enobrece" é uma dessas frases feitas que a gente repete sem refletir no que significam, feito reza automatizada. Outra é "A quem Deus ama, ele faz sofrer", que fala de uma divindade cruel, fria, que não mereceria uma vela acesa sequer. Sinto muito: nem sempre trabalhar nos torna mais nobres, nem sempre a dor nos deixa mais justos, mais generosos. O tempo para contemplação da arte e da natureza, ou curtição dos afetos, por exemplo, deve enobrecer bem mais. Ser feliz, viver com alguma harmonia, há de nos tornar melhores do que a desgraça. A ilusão de que o trabalho e o sofrimento nos aperfeiçoam é uma ideia que deve ser reavaliada e certamente desmascarada.
O trabalho tem de ser o primeiro dos nossos valores, nos ensinaram, colocando à nossa frente cartazes pintados que impedem que a gente enxergue além disso. Eu prefiro a velha dama esquecida num canto feito uma mala furada, que se chama ética. Palavra refinada para dizer o que está ao alcance de qualquer um de nós: decência.
"Assim como o sofrimento pode nos tornar amargos e até emocionalmente estéreis, o trabalho pode aviltar, humilhar, explorar e solapar qualquer dignidade"
Prefiro, ao mito do trabalho como única salvação, e da dor como cursinho de aperfeiçoamento pessoal, a realidade possível dos amores e dos valores que nos tornariam mais humanos. Para que se trabalhe com mais força e ímpeto e se viva com mais esperança.
O trabalho que dá valor ao ser humano e algum sentido à vida pode, por outro lado, deformar e destruir. O desprezo pela alegria e pelo lazer espalha-se entre muitos de nossos conceitos, e nos sentimos culpados se não estamos em atividade, na cultura do corre-corre e da competência pela competência, do poder pelo poder, por mais tolo que ele seja.
Assim como o sofrimento pode nos tornar amargos e até emocionalmente estéreis, o trabalho pode aviltar, humilhar, explorar e solapar qualquer dignidade, roubar nosso tempo, saúde e possibilidade de crescimento. Na verdade, o que enobrece é a responsabilidade que os deveres, incluindo os de trabalho, trazem consigo. O que nos pode tornar mais bondosos e tolerantes, eventualmente, nasce do sofrimento suportado com dignidade, quem sabe com estoicismo. Mas um ser humano decente é resultado de muito mais que isso: de genética, da família, da sociedade em que está inserido, da sorte ou do azar, e de escolhas pessoais (essas a gente costuma esquecer: queixar-se é tão mais fácil).
Quanto tempo o meu trabalho – se é que temos escolha, pois a maioria de nós dá graças a Deus se consegue trabalhar por um salário vil – me permite para lazer, ou o que eu de verdade quero, se é que paro para refletir sobre isso? Quanto tempo eu me dou para viver? Quanto sobra para meu crescimento pessoal, para tentar observar o mundo e descobrir meu lugar nele, por menor que seja, ou para entender minha cultura e minha gente, para amar minha família?
E, se o luxo desse tempo existe, eu o emprego para ser, para viver, ou para correr atrás de mais um trabalho a fim de pagar dívidas nem sempre necessárias? Ou apenas não me sinto bem ficando sem atividade, tenho de me agitar sem vontade, rir sem alegria, gritar sem entusiasmo, correr na esteira além do indispensável para me manter sadio, vagar pe-los shoppings quando nada tenho a fazer ali e já comprei todo o possível – muito mais do que preciso, no maior número de prestações que me ofereceram? E, quando tenho momentos de alegria, curto isso ou me preocupo: algo deve estar errado?
Servos de uma culpa generalizada, fabricamos caprichosamente cada elo do círculo infernal da nossa infelicidade e alienação. Essas frases feitas, das quais aqui citei só duas, podem parecer banais. Até rimos delas, quando alguém nos leva a refletir a respeito. Mas na verdade são instrumento de dominação de mentes: sofra e não se queixe, não se poupe, não se dê folga, mate-se trabalhando, seja humilde, seja pobre, sofrer é nosso destino, darás à luz com dor – e todo o resto da tola e desumana lavagem cerebral de muitos séculos, que a gente em geral nem questiona mais.
Ilustração Atômica Studio
Publicado na Revista Veja, Editora Abril
Edição 2148, ano 43 - nº 3, 20/01/2010
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...